Altinha ganha liga nacional e até lobby para virar esporte olímpico

Liga Altinha Brasil nasce para profissionalizar o esporte criado nas areias das praias do Rio de Janeiro e que se espalhou pelo litoral do país; tem até a modalidade “street”

Presente nas faixas de areia do litoral brasileiro, de maneira arrebatadora no Rio de Janeiro, seu berço, a altinha agora tem uma liga nacional. A Liga Altinha Brasil foi criada no fim de 2021 com a proposta de organizar competições pelo país e acelerar o processo de profissionalização do esporte, que há muito tempo é febre nas praias do país.

A tentativa de ares de profissionalismo à prática que surgiu por acaso no Rio dos anos 90 não é novidade: os campeonatos de altinha começaram a ser disputados há pelo menos cinco anos, mas com regras que variam de lugar para lugar, com diferentes pontuações e fórmulas de disputa. Geralmente, as rodinhas são formadas por três homens e uma mulher e, diante dos jurados, os quartetos se apresentam por quatro a cinco minutos, tentando aplicar manobras com a bola, sem deixá-la cair, para receberem a maior nota possível. Com a criação da Liga, o objetivo é justamente regulamentar e desenvolver o esporte.

– A gente viu que tinha necessidade de o esporte se organizar para poder crescer mais. É o esporte mais praticado no Brasil todo em praia, é um fenômeno, o que queremos é transformá-lo e, a partir disso, passar a beneficiar todos os envolvidos, as pessoas que trabalham dando aula, os atletas… – explica Paulo Ricart, de 50 anos, fundador da entidade.

A partir da fundação da liga, foi estabelecido, por exemplo, um manual de manobras e pontuações que baseará a avaliação dos jurados nos torneios. Movimentos como “Bike de letra”, “voo da águia” e “cambalhota” são os que rendem mais pontos (17), com exceção de qualquer manobra autoral cuja execução o júri julgue ser mais difícil – nesse caso, o limite é de 20 pontos.

Os movimentos que valem 10 pontos ou mais receberão a pontuação cheia somente quando executados pela primeira vez. Cada repetição vale 11 pontos. E também há penalidades por queda de bola: -5 pontos no caso de uma queda, -15 no caso de duas, -20 no caso de três…

Além da participação de Ricart, as regras são estabelecidas e aperfeiçoadas a cada edição de campeonatos por um trio fixo de jurados composto por Elie Benaderet, Cláudio Borges e Daniel Fraga. Todos eles com experiência no esporte que ainda engatinha no que diz respeito à profissionalização.

– Querendo ou não, é um esporte muito novo, embora muita gente já pratique informalmente nas praias – conta Paulo Ricart, que é formado em Educação Física e procura desenvolver com a Liga tanto a versão praia quanto a versão street da altinha, que cria desafios diferentes por conta do terreno:

“As regras mudam. Na praia você pode fazer uma manobra que, no street, já não pode. Esse corpo fixo de jurados me ajuda na tomada de decisões, o objetivo é criar regras que sejam mais justas possíveis para os atletas”, explica ele.

Altinha nas Olimpíadas?

E será que, um dia, a altinha pode chegar às Olimpíadas? Paulo Ricart tem esperanças de que a modalidade possa pintar em uma edição (bem) futura dos Jogos. Mas sabe que a missão é difícil. O primeiro passo é o Comitê Olímpico Internacional reconhecer o esporte. Desta maneira, a modalidade passa a responder a uma Federação Internacional, seguindo o código antidoping e a Carta Olímpica. Esta prevê que a Altinha, no caso, precisaria ser praticada por homens de pelo menos 75 países em quatro continentes e por mulheres em 40 países e três continentes.

– É um esporte que tem uma plasticidade e uma intensidade muito grandes, que envolve pessoas jovens. Você vê um amor muito grande dos praticantes do esporte, uma identificação, um amor enorme por aquilo que estão fazendo. É um esporte que precisava realmente se organizar. Vindo essa proposta, vamos fazer competições estruturadas, dando o melhor para os atletas e para as pessoas que estão assistindo. É um passo a mais levá-lo para outras pessoas conhecê-lo. Estamos nos estruturando internamente, com profissionais qualificados que estão vindo para somar. Para nós, poder alcançar esse nível de esporte olímpico seria de suma importância – conclui.

Altinha, um esporte para todos

A pluralidade é um dos pontos que transformam a altinha em uma modalidade tão comum nas praias do Rio de Janeiro. Com uma bola, duas pessoas e uma pitada de habilidade, a bola está no ar. As inúmeras “rodinhas” à beira da água fazem parte do cenário do Rio de Janeiro – e já existe até escolinha para quem quer aprender a praticar ou se aperfeiçoar no esporte.

Elie Benaderet comanda a Escola de Altinha Posto 9, em Ipanema. Ele ministra aulas para pessoas de idades variadas e chama a atenção para a presença das mulheres, em grande número dentre seus alunos.

– A procura pelas aulas vem aumentando. Eu achava que era meio a meio, mas a mulherada tomou conta. A sociedade, anteriormente, afastava a mulher da bola, mas elas estão tomando o espaço, aprendendo, jogando e participando. Eu trabalho com pessoas de 12 a 65 anos. É um esporte fácil de ser praticado. Estamos nos profissionalizando nos campeonatos, as regras vão se adaptando, aumentando os patrocínios. Hoje, há grandes empresas contratando a altinha como aula aos seus funcionários, gerando saúde e bem estar a eles.

A influencer digital Ana Heckert é uma das adeptas da Altinha como lazer e exercício físico, afinal, a atividade melhora a concentração, a capacidade aeróbica, a coordenação motora e a interação social. Seja na praia de Itacoatiara ou em Ipanema, a jovem está sempre praticando e participando de campeonatos da modalidade.

– Eu comecei a jogar pedindo para entrar nas altinhas na praia. Eu não sabia nada. Só tinha homem, eles não gostavam muito porque eu era perna de pau. Eu insisti, fui aprendendo. É muito bom, é um exercício físico, eu amo. Sinto trabalhar o corpo inteiro, é uma sensação gostosa, você sua bastante. Na altinha, trabalho o equilíbrio, tem que jogar coma a perna semiflexionada, tem o posicionamento do corpo, das mãos, que fazem a gente se equilibrar e jogar melhor. Os campeonatos são divertidos também, é uma mistura de emoções, de não errar, de manter a bola no alto, fluindo, porque a pontuação é em cima de uma “trick” (manobra) que você faz e do tempo que a bola fica no alto.

O veterano Alexandre Canela é um dos precursores da Altinha no Rio de Janeiro. E nem mesmo o fato de ter amputado parte da perna direita o afastou da sua paixão. Ele, inclusive, atua em campeonatos com sua equipe, a Alta Inclusão.

– Eu tive trombose por conta do tabagismo, fiquei nove meses no hospital. Há dois anos perdi parte da perna. No hospital, eu já imaginava como eu iria jogar altinha, porque sou amante desses esporte. Eu jogo sentado, essa parte de inclusão começou comigo. Eu participo dos campeonatos, tenho chegado ao pódio. Fui campeão em Cabo Frio (RJ). O nosso esporte agrega todo mundo, não depende de espaço, dá para jogar na quadra, no play, no corredor, em uma varandinha. É uma febre total.

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