Um estudante da rede estadual de São Paulo terminou o ensino médio em 2021 com uma defasagem de quase seis anos em matemática. Em língua portuguesa, este aluno saiu da escola pública com um desempenho adequado para adolescentes que estão no 8º ano do ensino fundamental — ou seja, quatro anos antes.
As análises foram feitas a partir dos resultados do Saresp (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) 2021, divulgados nesta quarta-feira (2) pela Secretaria de Estado da Educação. As perdas de aprendizagem, na avaliação das autoridades e de especialistas na área, são um reflexo da pandemia — que levou ao fechamento das escolas e atividades remotas, precárias em alguns contextos.
Para o secretário da Educação, Rossieli Soares, os resultados do Saresp 2021 eram esperados. “Queremos cruzar dados para entender, por exemplo, quem teve melhor desempenho assistiu mais aula? Entregou mais atividades? Vamos descobrir quais fatores deram mais certo ou não”, afirma.
Assim como as demais etapas avaliadas, o ensino médio apresentou queda em comparação com a prova realizada em 2019.
Há dois anos, a proficiência era de 276,6. Em 2021, ficou em 264,2. A média de proficiência em matemática entre os alunos da 3ª série do ensino médio foi a pior da série história — os últimos 11 anos.
“São Paulo foi um dos estados que mais rapidamente começaram a oferta de atividade remota e foi um dos primeiros a retornar com as aulas presenciais, mas, ainda assim, podemos ver grandes perdas em todas as etapas”, afirma a especialista em educação e também presidente do CNE (Conselo Nacional de Educação), Maria Helena Guimarães de Castro.
Os estudantes realizaram a avaliação nos dias 9 e 10 de dezembro do ano passado. A prova trouxe questões de língua portuguesa, matemática, ciências da natureza, uma redação e um questionário socioemocional (focado nas habilidades para lidar com emoções e desafios do dia a dia).
Nesta primeira divulgação, a secretaria estadual de Educação apresenta os dados de português e matemática. Os demais resultados estarão disponíveis, segundo Rossieli, até 30 de março.
Mais de 642 mil alunos do 5º e 9º anos do ensino fundamental e da 3ª série do ensino médio da rede estadual realizaram a prova.
Segundo a pasta, 96% dos estudantes do último ano não conseguem responder uma pergunta como esta: “considere um poliedro regular com 8 vértices, 6 faces, 12 arestas. Esse poliedro pode ser um(a)”. Entre as opções estão: cubo, tetraedro, pirâmide de base quadrada, prisma de base triangular ou octaedro.
“Aquilo que já era ruim ficou pior. Estou usando uma frase que já foi muito publicizada para dizer que o ensino médio já estava no fundo do poço e a pandemia mostrou que podia piorar”
Defasagem em matemática também afeta ensino fundamental
Os estudantes do 5º e 9º anos também apresentaram queda no desempenho de matemática. No 5º ano, a proficiência de 2021, 210,2, ficou semelhante ao resultado de 2013, que era de 209,6.
A gestão de João Doria (PSDB) cita como exemplo uma questão que envolve conta de subtração. “Uma construtora encomendou 10.000 parafusos a uma loja. Mas a loja possuía apenas 3.825 em estoque. A quantidade de parafusos que falta para completar a encomenda é ?”.
Segundo a secretaria, 61,6% dos alunos do 5º ano, provavelmente, não conseguem resolver a questão. Entre os alunos do 9º ano, apenas 12,5% tem um desempenho adequado.
A presidente do CNE garante que para evitar novas perdas é necessário continuar ofertando atividades presenciais, deixando as escolas abertas.
“Todos os alunos serão impactados. Não só em São Paulo, mas estudantes do Brasil inteiro, da rede pública, da particular. Sempre há alunos que se devolveram mais, mas a maioria dos alunos foi bem prejudicada e está ingressando no ensino superior sem estar devidamente preparada e, no caso, do mercado de trabalho, menos ainda”
Língua Portuguesa
Os resultados também ficaram abaixo do adequado em língua portuguesa. Um aluno que estava no 5º ano em 2021 apresenta uma proficiência de um estudante do 3º ano.
Cerca de 51% desses alunos, por exemplo, não conseguiriam responder uma questão para identificar a finalidade de um texto. Menos da metade, 32,8% dos estudantes do 5º ano, tem o conhecimento adequado esperado na disciplina.
No 9º ano, os alunos tem o conhecimento adequado para o 7º ano. Essa é uma fase de transição, ou seja, estudantes dessa etapa chegam ao ensino médio com pelo menos dois anos de defasagem nos conteúdos.
Em relação a 2019, o 9º ano apresentou perdas de 3,3%, caindo de 249,6 para 241,3.
Programa de recuperação
Para Maria Helena, a secretaria devem estruturar um programa de recuperação para alunos do ensino médio que saíram da escola com tantas defasagens. “É importante prepará-los para vida, ensino superior e também desenvolver habilidades de trabalho”, afirma.
Os estudantes das demais séries precisam ter um acompanhamento de perto, segundo a presidente do CNE. “A única maneira de recuperar essas defasagens é oferecendo programas de recomposição das aprendizagens”, afirma.
Rossieli afirmou que os alunos que concluem o ensino médio têm ainda a chance de cursar um quarto ano opcional, criado em 2020, a depender de vagas disponíveis. O secretário afirmou que também que pretende lançar um programa com aulas aos fins de semanas, que poderia beneficiar ex-alunos e no preparatório do vestibular.
A reportagem questionou a secretaria do número de alunos que já manifestaram interesse no 4º ano, mas a pasta não respondeu. A informação será incluída no texto caso seja enviada.
Mudanças para 2022
No final deste ano, além das disciplinas tradicionais do Saresp, a secretaria fará uma prova amostral de ciências humanas para os alunos dos 5º e 9º anos, além da 3ª série do ensino médio.
Uma prova de inglês, no formato censitário, também será aplicada para ter como “linha de base”. A avaliação será aplicada para as mesmas turmas do Saresp.